Uiramutã, o Coração Verde que Pulsa os ODS: Onde o Brasil Começa a Sonhar com 2030

No ponto mais alto do mapa brasileiro, onde o vento sopra em idioma Macuxi e o céu amanhece em cantos Wapichana, uma pequena cidade indígena acaba de assumir um papel de protagonista global. Uiramutã, com menos de 12 mil habitantes e quase 100% de território indígena, foi escolhida como o primeiro município do Brasil a dar o passo inaugural rumo aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU — os tão falados ODS. Mas por que começar por aqui, tão longe dos centros políticos e econômicos do país? Justamente por isso. “Se quisermos um futuro sustentável, ele precisa nascer onde a vida pulsa em equilíbrio com a terra há séculos”, declarou Lavito Person Motta Bacarissa, da Comissão Nacional para os ODS, durante uma cerimônia que mais parecia um encontro entre mundos: o institucional e o ancestral. Em Monte Moriá I, uma das comunidades indígenas de Uiramutã, danças circulares se entrelaçaram a discursos de esperança. Cânticos ecoaram entre árvores centenárias e crianças apontavam para maquetes feitas com papelão reciclado, explicando, com brilho nos olhos, o que significa cuidar da floresta como quem cuida da própria avó. “Estamos escrevendo uma carta para a COP30, mas também estamos escrevendo o futuro com a tinta das nossas raízes”, disse a professora Leny Costa, coordenadora de projetos que unem educação indígena, meio ambiente e ciência. Os temas dos ODS — como educação de qualidade, igualdade de gênero, energia limpa e combate à fome — foram apresentados não como metas distantes, mas como práticas vivas: nas hortas comunitárias, nas rodas de contação de histórias, nas oficinas de artesanato com sementes e na construção de saberes bilíngues, onde o português é hóspede e não senhor. A iniciativa foi saudada pelo prefeito Benísio Rocha como “um reconhecimento histórico” e vista por lideranças indígenas como uma chance real de influenciar políticas públicas que, até aqui, pouco chegaram aos confins da floresta. Uiramutã, até ontem um ponto quase invisível nas estatísticas nacionais, agora é a bússola do Brasil rumo a 2030. E talvez seja simbólico — e necessário — que o futuro sustentável do país comece exatamente onde a terra ainda é chamada de mãe, e o progresso não seja medido apenas em concreto, mas em cuidado.

Uiramutã: Jovens Macuxi Transformam Saberes Ancestrais em Ciência Viva

Em uma manhã de abril marcada pela troca de saberes, a comunidade Macuxi de Monte Moriá I, em Uiramutã, recebeu uma exposição científica que transcendeu os limites da sala de aula. Estudantes da Escola Municipal Indígena Cícero Canuto de Lima apresentaram dez projetos que conectam práticas culturais tradicionais à pesquisa científica, reafirmando a importância da educação intercultural. Ao lado do malocão da comunidade, cerca de 11 quilômetros da sede do município, os alunos compartilharam experiências que envolvem letramento na língua materna, artesanato, agricultura tradicional, pesca, culinária típica e até mesmo a construção de maquetes da própria comunidade utilizando materiais recicláveis. A professora Leny Costa destacou que o projeto também enfatiza a importância da preservação ambiental, alinhando-se aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, cujo projeto-piloto está sendo conduzido em Uiramutã. A gestora da escola, Karla Rodrigues, ressaltou que a ação promove o fortalecimento da identidade indígena por meio da educação. Segundo ela, a exposição também teve caráter preparatório para a feira de ciências prevista para ocorrer ainda este ano. O evento contou com a presença de autoridades locais, como o prefeito Benísio Rocha e o secretário municipal de Educação, Damázio de Souza Gomes, que elogiaram a iniciativa como um reflexo do compromisso com o fortalecimento do ensino indígena. Com 174 estudantes matriculados do 1º período da Educação Infantil ao 9º ano do Ensino Fundamental, a escola Cícero Canuto de Lima atende a uma comunidade de cerca de 490 moradores, todos da etnia Macuxi. A exposição científica não apenas celebrou a riqueza cultural do povo Macuxi, mas também evidenciou o potencial transformador da educação que respeita e integra saberes tradicionais.

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